Herói
Invariavelmente a morte é a estrela desse pequeno palco. Muitas são as formas de falar dela, o que acontece depois (ou se não acontece nada, que é o que me assusta), mas pouco se fala de como se chega a ela. Em linha gerais, creio que seja uma marcha mesmerizada até um desfiladeiro, no qual todos cairemos quando chegar a nossa vez. Não queria que fosse assim, mas acho que é. A única coisa que me conforta, não por evitar esse destino fatal, é ver que de vez em quando, uma criança de doze anos pode sair correndo, furar a fila e passar todo mundo, naquele instante, só porque fez algo correto. O que conforta, claro, não é a noticia da sua morte, mas a idéia de que ações como essas fazem com que eu acorde dessa marcha angustiante para o desfiladeiro. Como uma vez um professor meu disse “pode-se morrer, mas não de qualquer jeito”. E foi justamente o que aconteceu com Emerson Gomes essa semana. No domingo ele estava brincando na rua com outras crianças, quando começou um tiroteio. Ele correu em direção a outra criança, um amigo, com metade da sua idade, e o protegeu com o próprio corpo enquanto a insanidade comia solta. Por causa disso foi baleado, se não me engano no quadril, e foi hospitalizado. Ele faleceu nessa segunda-feira, quando tinha doze anos. Creio que se não fosse por ele, quem teria levado a bala seria o amigo, de seis anos. Outra coisa que chama a atenção para a história, como se já não fosse muito esse ato de... nem vou tentar nomear isso... a razão pela qual o tiroteio tinha começado, foi que uma vez um cara impediu que bandidos roubassem um celular. Os safados, não satisfeitos com os planos frustrados, foram atrás do sujeito e meteram bala. Não sei o que houve com esse cara, mas gostaria de saber. Espero realmente que esteja bem. Uma pessoa morrer por fazer o que considera certo já é um preço muito alto. Agora, eu não sei o que é pior: se é uma criança ter mais juízo do que um adulto a ponto de fazer uma opção tão foda quanto essa enquanto esses malditos bandidos fazem a escolha errada – duas vezes – ou se é uma espécie e sensação que essa notícia traz. Porque é uma coisa que me divide. Ao mesmo tempo que fico emocionalmente feliz por ver um herói – um herói de fato! – fico triste por ele se fazer necessário, e mais, por ter que pagar com a própria vida por isso. Ah, esse texto está uma merda, não é metade do que eu quero dizer e muito menos é metade do que esse garoto merece. Eu só queria que esse evento não passasse em branco e que talvez, mais alguém pensasse sobre isso.
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Um comentário:
Nossa, quanta coisa...
A violência está em tantos cantos que alguns ficaram invisíveis. A gente vê a bala, o tiro, o assalto, a morte, e parece que foi preciso chegar a esse radicalismo pra gente se chocar, pensar sobre, fazer algo. Isso, de fato, é muito chocante, muito triste, muito sério. Mas antes teve um outro roubo, o desvio de verba, a escola que não funciona, a casa na rua, a fila da saúde às 4 da manhã, a riqueza tão mal distribuída, a exploração, a miséria. E essas violências foram sendo jogadas embaixo de tapete, até que não deu mais pra esconder, até virar ameaça pra quem tinha o bolso cheio. E pra resolver, mais tiros, mais violência, mais mortes. Desse jeito, vai ser difícil mudar tudo isso. Tem que ter outro.
Espero que muitos alguéns estejam pensando sobre isso. Gostei do post.
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