Precisa de internação precisa!

Então, com um grande atraso nas “novidades midiáticas” e apesar das atualizações infrequentes, lá vamos nós.
A essa altura do campeonato todo mundo já está careca de saber sobre os fatos do assassinato do cartunista Glauco e seu filho Raoni, certo? Então, todos saber as condições de Cadu, e provavelmente também sabem sobre sua história. Partamos daí.
A razão desse post, contudo não é o evento em si, mas o desencadear que me ocorreu quando li alguns textos e comentários de dois psicanalistas: Contardo Calligaris, que acredito ser colunista da Folha (não sei ao certo pois tive acesso ao seus textos em um blog que não é dele, mas que faz postagens de sua coluna – www.contardocalligaris.blogspot.com) e Luciano Elia, cujo texto me foi enviado por e-mail por uma amiga. O que emergiu disso tudo foi a questão da internação, que eu acreditava estar bem organizada na minha cabeça, mas agora vejo que, talvez, nem tanto.

De forma didática, acho que a gente pode encarar o processo de internação do louco em dois sentidos. O politico e o clínico. No primeiro, teremos a prática higienista no qual a orientação não está acordada com a necessidade do sujeito de alguma interferência institucional por conta de alguma precariedade de inserção na comunidade ou sofrimento em demasia. Nesse sentido, teríamos as internações que servem como depósito de indesejáveis. Pessoas que, por alguma razão, tornam-se complicadores sociais – seja lá qual forem as complicações que trazem. Aí teremos o louco, o mendigo, o ladrão e outras tantas categorias confinadas em um mesmo espaço (físico e social), indiferenciadas, com tratamentos indiferenciados. Veja que daí o que prevalece é a indisponibilidade da sociedade em lidar com esses sujeitos e daí, uma prática que não os acolhe ou trata ou seja lá o que for preciso para cada um. Ela apenas os tira da vista dos “cidadãos de bem”.

No outro extremo, temos a internação clínica, e aqui me refiro apenas ao louco e ao sujeito em sofrimento psíquico (e talvez a outros casos peculiares). Seja como for, essencialmente eu digo: cada complicador em seu espaço, ou melhor dizendo, cada complicador com o suporte necessário (é que isso implica muitas vezes – não sei se certa ou erroneamente – em espaços diferentes). Dessa forma, temos a internação como recurso específico para lidar com pacientes específicos em momentos específicos. Sendo mais direto: o louco pode passar por momentos dos mais variados, sujeitos a uma série de circunstâncias. Tais variações, acredito, sugerirão ações diferentes por parte daqueles que o acompanham, utilizando de serviços diferentes para cada ocasião. Em dados momentos uma internação pode fazer-se necessária, como por exemplo quando o paciente se encontra tomado de maneira tal por seus delírios, que desconecta-se completamente do que o cerca, redundando na inoperabilidade da intervenção clínica (do psicólogo, por exemplo). Mas o que é fundamental nessa prática é termos em mente que o que orienta o uso de um dispositivo ou de outro é a função que ele pode exercer sobre o paciente. Isso gira o eixo do processo de internação, que sai daquilo que seria sua função política de esconder os indesejáveis (algo que admitimos hoje como atitude impraticável – porém muitas vezes praticada!) e passa a ter razão clínica que contribuir para algo que traga ganho ao sujeito (ou evite prejuízos). Outra mudança que esse giro traz é a necessidade de avaliação de cada caso individualmente, uma vez que a internação por razões clínicas não comporta a equação pré-definida “louco=internação”. Ela propõe-se a pensar se nesse caso específico a internação pode trazer algum ganho para o sujeito. Seja lhe dando asilo ou acompanhamento intensivo. Seja protegendo-o dos percalços cotidianos e, porque não?, protegendo quem o cerca de eventuais ações nocivas que ele possa ser levado a cometer.

Embora eu não esteja muito à vontade com essa tal de “internação política”, pois acredito que há outras formas de entender a política das internações, decidi usar essa expressão assim mesmo, mas deixando claro que me refiro a uma forma de se praticar as internações, não pretendendo encerrar apenas nessa definição tudo que a palavra “política” pode compreender. Desculpem por isso.

Sei que tem psicólogo lendo isso, portanto gostaria da opinião abalizada de vocês.

4 comentários:

Mim disse...

Você tocou num ponto nevrálgico da discussão anti-manicomial. Muitos são extremamente maniqueístas e não podem nem mencionar a palavra internação. Entendo-os, pois, além dos excelentes pontos-ve-vista listados por você, tem uma outra coisa: como se dá o decorrer dessa internação, e mais, como se dá a alta da internação. Você tocou nos pontos relativos à decisão de internar ou não. Mas, internando, o que se dará? Circo dos horrores, gente no chão, gente amarrada, poucos profissionais, o estigma do manicômio? Ou lugar digno, no bairro perto de casa, sem grades, com acesso da família, com profissionais para cuidar e orientar, comida digna, alta trabalhada com serviços extra-hospitalares?
Minha opinião é essa. Concordo totalmente com as internações clínicas, desde que levadas clinicamente em todo seu decorrer, incluindo alta.
Detesto maniqueísmos e tabus, como se certas coisas fossem proibidas para sempre.
E adoro seus textos!
beijão

Lu disse...

Acho que vocês já disseram muitas das coisas que penso. Não se pode analisar apenas a prática clínica quando ela está descolada de uma reflexão sobre cada caso e de que forma estará sendo feita. A internação não é por si só condenável ou não, mas é preciso discutir as considerações de cada situação, suas implicações, a que propósitos está servindo, a localização numa história. Aliás, esse é o trabalho da clínica, não é mesmo?

Beijos, Vitôncio! Continue postando!

Lu disse...

eu só tenho o email dela: maisapsi@yahoo.com.br. A Paula com certeza tem, pode ligar pra ela? Bjão!!

Mim disse...
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